sábado, 3 de julho de 2021

livro das províncias de ego

 

(Escultura de Ney Sayão - sátiro)


a mitologia segundo id



I.



exaustamente, ele criou o universo e os outros deuses, além de algumas baratas

que não ignorou, apesar de serem vãos sopros de sua formosura.

descansou semanas a fio numa casa de massagens lendo tio patinhas nas bibliotecas sem escadarias,

e assustou-se ao ver como podia fazer o tempo passar depressa

se enrolasse seus bobs.

os homens nesses tempos bravios eram fortes e vazios, com membranas de éter,

e nenhum pensamento entrecruzava esse ar, permitindo total calmaria.

mas as tempestades começaram a azucrinar os seres mais susceptíveis de tal,

e ele criou a neblina para impedir que visse além

dessa tênue cortina

imóvel.



II.



e antes que viessem as religiões e os religiosos, ele criou os puteiros

todos se deliciavam nessas centrais de orgias.

daí vieram as freiras e os padres e os rabinos e a polícia e os vizinhos,

e ele criou a impotência para castigar aqueles que o combatiam

e todos, impotentes, bateram uma punheta

em retirada.



III.



e os homens se desligaram dele, e criaram seu próprio mundo, seus próprios refrigeradores e tapetes de camurça e capachos,

e se esqueceram que algo além de aves sobrevoava suas cabeças

e ignoraram que algo além dos ventos acariciava seus rostos nos dias de desesperança;

e ele ficou triste, e ele se retirou como um relógio velho, o relógio dos tempos que se foram

sem dizer tchau;

e até hoje não voltou de seu recanto de veraneio

desejo

e frustração.



saiu de fininho, deixando a porta entreaberta e dois tomates numa geladeira desligada.


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