quarta-feira, 27 de julho de 2022

Eu me amo

 

 (Manet - Mallarmé)



Serenamente, percorreu a face,

Trilha de sortilégios ocultos

E desmesurados;

Com audácia, tolheu-lhe o olhar

Sem expressão,

E sorriu daquilo que nunca pode

Compreender.

Tomou do lápis – lança de batalha –

E imprimiu o que seu sangue

Jorrava-lhe aos ouvidos,

Numa entonação ora doce e frágil,

Ora forte e resoluta,

Assustando até.



[Pausa para pequena tosse (cof!)]



Parou.

Abandonou o lápis e o parto

E olhou o fruto do seu labor inútil

Entre gritos e sobressaltos.

A expressão – ah, essa era indefinível

E indefinida; algo entre soluçar

E espasmo sutil.

Numa interrogação sem ponto,

Anzol ou gancho vulgar,

Postou seu corpo,

Tomou uma xícara de café

E sentou-se à mesa, dando risadas,

Esboçando sorrisos,

Contando histórias sem fim.



(1985/04)

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