quarta-feira, 9 de junho de 2021

a poesia me é difícil como o sorriso

 

(Fredrik Raddum - o poeta)


a poesia me é difícil como o sorriso

ou um menino sem nome, onde ela está?

eu vi o homem jogado num canto, roto

e todas as manhãs eu me confronto com

a miséria sussurante à minha volta: bom dia, bons dias.

onde há o espaço para meu vaso de crisântemos?

o olhar que eles me lançam não é piedoso, sequer de bondade,

eu vejo a fome nos seus olhos, eu vejo meus olhos

e desvio. mas que belo portão esse! é art-déco?

nesse cotidiano, as ameaças se sucedem

e eu soçobro: (*) peçam-me versos

(é a estupidez necessária de todo escritor).

mas veja: ali vai, cabisbaixa e faminta

a poesia, fêmea de olhos lânguidos

e onde a palavra vela! em que região?

na fronte o suor,

o rosto a abrasaria; o seio, creio, o pó,

os pés (como o sorriso) lançá-la-iam a esmo;

mesmo as mãos, cujas marcas

escavadas tão bem se prestariam às

paráfrases e metonímias, mas não!

os dias cairiam como grãos

e a erosão conta dela daria.

a miséria, bem o sei, não é verbo,

substantivo;

cabe o conformar-se ao papel o verso,

pois o poema persiste

em sua sina errante de ser vivo.



(*) A partir desse ponto, o poema está escrito a mão, com várias correções.


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